sexta-feira, outubro 08, 2004

Barbarismos da Linguagem Corrente


DESCULPABILIZAÇÃO -- A mania, que certos políticos grangearam ultimamente, de se quererem evidenciar das outras pessoas pelo emprego de palavras de formação exótica ( tais como: conflitualidade, facilitismo, priorização, amiguismo ou confiabilidade), leva-os por vezes à criação de aberrações linguisticas da natureza do termo referido no título desta entrada lexicográfica.


Ora, se nós dispomos, há séculos, do vocabulário desculpa, constituído apenas por oito caracteres, para expressar ideia de justificação, porque motivo havemos de aceitar agora a palavra desculpabilização, formada por mais nove letras, cujo acréscimo nada beneficia o sentido já bastante explícito do pensamento que se pretende transmitir?


Como não podia deixar de ser, os colaboradores do sempre discutível e dispendioso " Dicionário da Língua Portuguesa", apesar das nossas constantes objurgatórias acerca deste assunto e similares, não se retraíram de dar acolhimento, nas suas próprias páginas, a este inqualificável disparate! Não os imitemos no bizantismo, pois a linguagem tradicional, herdada dos nossos antepassados, merece maior respeito!


DESLARGAR-- Este verbo, ocorrente nas páginas 263, 265, 270, 283, 298 e muitas outras do romance" que farei quando tudo arde?", escrito por António Lobo Antunes, considera-se de formação espúria e contraditória. E isto porquê? Porque largar é sinónimo de soltar, desprender, e, como o sufixo des traduz uma ideia de negação, logo: deslargar significa necessariamente não soltar, não largar, o que representa, na realidade, a ideia aposta àquela que se deseja transmitir ao nosso interlocutor.


Usemos apenas, portanto o verbo largar, sem qualquer prefixo de reforço, se nos pretendermos exprimir em português de boa cepa, e deixemos apodrecer o inditoso deslargar no arquivo das invenções inúteis, ainda que estejam perfilhadas por escritores de renome.


DESPISTAR-- Desde há longos anos empregado em português com o sentido específico de sair de pista, desnortear-se ou desorientar-se, o verbo registrado em epígrafe começou agora a ser insistentemente usado por alguns alguns médicos, em vez de rastrear, na frase despistar uma doença (tradução literal do francês dépister une maladie).


Ora, nós não precisamos deste barbarismo para nada, pois em português de lei já dispomos felizmente, da locução rastrear uma doença, a qual traduz, com rigorosa propriedade, a ideia que desejamos transmitir ao nosso interlocutor.


E que pretendem, afinal, aqueles médicos, senão pesquisar investigar, procurar, indagar, encontrar, descobrir, desvendar a pista de uma doença, precisamente o contrário da ideia que o verbo despistar exprime? Deixemos, portanto, despistar os veículos, as pessoas ou animais, que sejam forçados, por qualquer motivo, a sair do seu caminho (pista), desde que lhes não aconteça qualquer desastre, mas continuemos a manter na linguagem quotidiana a expressão rastrear uma doença, conforme a prática tradicional dos clínicos de craveira do Professor Ricardo Jorge, cujo amor à nossa língua sempre se manteve na primeira linha das suas preocupações.


Por: Francisco Alves da Costa in: Olivais - Outubro /2004